Ombro de nadador

08/06/2011 09:24

 

OMBRO DO NADADOR – VISÃO ATUALIZADA

No último mês de maio, durante o Congresso da ISAKOS, que vem a ser o maior

evento médico científico em nível mundial sobre lesões esportivas, foram discutidas

medidas preventivas e terapêuticas do “ombro doloroso”, uma síndrome dolorosa

que ocorre principalmente nos indivíduos praticantes de atividades físicas ou

esportivas, que envolvem movimentos amplos da articulação do ombro. Estão

incluídos nestes esportes a natação, o beisebol, o tênis, o handebol e todos aqueles

que exigem o movimento chamado de “arremesso”, onde se realiza uma sequência

biomecânica de “rotação externa e abdução” seguida de “rotação interna e

adução” do ombro. 

Durante a realização deste “gesto esportivo”, as estruturas articulares do ombro

(ossos, músculos, tendões e ligamentos) são levadas a um nível de exigência muito

alto e, com a repetição contínua do movimento, podem ser lesadas ao longo do

tempo. 

Nos esportes aquáticos, temos o envolvimento do ombro através deste gesto

esportivo em todas as modalidades (natação, nado sincronizado, pólo aquático e

saltos ornamentais), portanto torna-se muito importante o entendimento de como

podemos minimizar os efeitos deletérios que podem ser gerados.

O primeiro ponto que deve ser analisado refere-se às atividades realizadas nos

treinamentos das categorias de base, principalmente naquelas abaixo da idade de

14 anos. A discussão sobre a carga de treinamento empregada nessas categorias,

diz respeito não só a “performance” do atleta, mas também aos cuidados com a

saúde do mesmo. Em recente pesquisa realizada nos EUA, foi divulgado que a

atividade esportiva é a maior causa de lesões em adolescentes americanos e que,

cerca de 50% destas lesões são ocasionadas por esforço repetitivo relacionado a

prática esportiva. Considerando que os EUA têm uma população de adolescentes

atletas estimada em 40 milhões de indivíduos e que, cerca de 3 milhões de crianças

recebem atendimento médico por ano devido à lesões esportivas, tornou-se lá um

fenômeno de saúde pública e assim foi criado um programa chamado S.T.O.P

(Sports Trauma and Overuse Prevention in Youth Sports), onde medidas estão

sendo tomadas em um conjunto que envolve profissionais de saúde, treinadores,

dirigentes esportivos e familiares dos atletas.

 Os principais fatores de risco apontados neste estudo como potenciais geradores

de lesão são: gesto esportivo errado, erros de treinamento (volume e intensidade

inadequados), uso de equipamentos esportivos inadequados para treinamento,

pressão de treinadores e pais, especialização esportiva precoce, o não

reconhecimento precoce do surgimento de lesões e o desequilíbrio muscular

encontrados nesta faixa etária.

Baseado neste estudo, algumas medidas foram propostas visando diminuir a

incidência de lesões. 

Valorizar de forma prioritária a correção da técnica envolvida no gesto esportivo,

evitar definitivamente os treinamentos ou as participações em competições sob

intensa fadiga muscular, como ocorre nos treinamentos muito volumosos e intensos

e na participação em inúmeras provas e competições em uma mesma temporada,

não estender demasiadamente uma temporada de competições. Um estudo

demonstrou que quando estas crianças competem mais do que 8 meses por ano, o

risco de lesões aumenta em até 500% e quando elas competem sob intensa fadiga,

este índice chega a 3600%.Outro aspecto importante a ser abordado, diz respeito ao condicionamento

muscular que deve ser realizado por todos os atletas que praticam o gesto do

“arremesso” em sua atividade esportiva, servindo tanto como prevenção como

tratamento das lesões que acometem a articulação do ombro.

Neste item, dois aspectos assumem grande importância: o primeiro sugere que

estes atletas realizem regularmente o protocolo de fortalecimento muscular dos

componentes do chamado “manguito rotador”, que compreende os músculos

supraespinhoso, infraespinhoso, redondo menor e subescapular mais a porção

longa do bíceps braquial (esta série se consegue realizar com a utilização de

elásticos (“theraband”), através dos movimentos de rotação interna, externa,

flexão, extensão e abdução do braço, em uma amplitude de 45 graus com cotovelo

fletido em 90 graus). Este trabalho facilita o posicionamento da cabeça umeral na

articulação, de forma a impedir que ocorra um grande impacto no ombro durante

a realização do gesto esportivo do “arremesso”; o segundo acrescenta a

necessidade de realizar também o trabalho de fortalecimento da musculatura

escapular (trapézio, grande dorsal, serrátil anterior, peitorais e rombóides), devido

ao fato de que a grande maioria destes atletas apresenta alterações da

movimentação da escápula (“discinesia escapular”), levando a um esforço

aumentado das estruturas articulares do ombro para seu adequado

posicionamento.

Este trabalho de fortalecimento muscular deve ser empregado com uma

importância similar àquela dada ao treinamento específico, para que os atletas se

conscientizem da sua necessidade e a incorporem em sua cultura esportiva. Além

disto, a forma de realização deste tipo de atividade requer um padrão de

excelência que deve ser atingido, pois sua inadequada realização determina uma

“falsa idéia” de ineficácia.

 Portanto é fundamental que os atletas sejam orientados e supervisionados durante

a realização deste tipo de trabalho, pois não é incomum percebermos que atletas

que afirmam realizar esta atividade não apresentarem os efeitos da mesma, devido

a erros na sua prática.

Outro aspecto de real importância na prevenção e terapêutica do “Ombro do

Nadador” é a correção da técnica empregada no gesto esportivo. Estudos

demonstram que o excesso de rotação externa e abdução do ombro, no início da

fase de recuperação da braçada, seja uma das principais causas de impacto no

ombro do nadador e que a sua correção beneficia o atleta. 

Em relação ao Pólo Aquático, onde além da natação o atleta realiza o movimento

do “chute”, a sobrecarga na articulação do ombro dominante é maior.

Um aspecto extremamente importante é a altura com que o atleta consegue

ultrapassar o nível da água no momento do arremesso. É fundamental que o atleta

deixe a maior parte do tronco fora d’água durante o “chute”, pois a musculatura

axial contribuirá para evitar o esforço demasiado do ombro. Quanto mais

“afundado” o atleta realiza o chute, maior será o impacto no ombro. Para

minimizar este impacto, torna-se fundamental o fortalecimento muscular dos

movimentos de pernas e principalmente do tronco, que promoverão uma maior

estabilidade dos gestos dos ombros, além da grande atenção dos técnicos das

categorias de base, onde estes movimentos ainda poderão ser corrigidos para o

restante da carreira esportiva .

É muito importante que todos os envolvidos com estes esportes participem de

forma ativa na conscientização e emprego destes conceitos na sua atividade

esportiva, pois quando falham estas intervenções e os atletas têm a necessidade depassarem por cirurgia, apenas cerca de 50% retornam ao mesmo nível de

qualidade atlética, segundo estudos recentes.

Dr. Cláudio Cardone

Diretor Médico da CBDA

claudiocardone@terra.com.br